Deus não dá importância ao tempo – Uma reflexão a partir da série Outlander

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Assistindo ao episódio três da sétima temporada da série Outlander, me deparei com uma frase no mínimo interessante e que me fez pensar.

Essa série desenvolve o romance do casal Jamie e Claire Fraser, que se conhecem após uma misteriosa viagem no tempo que transportou Claire do século XX para o ano de 1743. No decorrer da história outros personagens são inseridos, como a filha do casal, Brianna Randall Fraser. Assim, na sétima temporada a trama apresenta o casal Fraser ainda no século XVIII, enquanto sua filha Brianna e família se veem obrigados a voltar para o presente, século XX. Diante disso, Claire e Jamie passam a escrever cartas para a sua filha dizendo como eles estão e os desafios que passam. Do outro lado, Brianna tem a oportunidade de ler essas cartas, que em seu tempo estão todas dentro de uma velha caixa. Então, no episódio citado acima, Jamie escreve uma dessas cartas, antes de partir em uma viagem de volta para a Escócia, onde ele diz:

Minha querida filha, parece estranho pedir que reze pela segurança de uma viagem que terá a muito tempo terminado quando souber dela. Eu peço de qualquer forma. Acho que Deus não dá importância ao tempo.

Assim que ouvi essa última frase eu fiquei impactado, pois isto é muito coerente: “Deus não dá importância ao tempo”. E por que daria? Se Ele é o criador do tempo, logo, Ele existe além deste. Os efeitos do tempo não podem atingir a Deus. A demora do tempo não afeta a Deus. Agostinho de Hipona, em Confissões, disse:

Portanto, não houve tempo em que Tu não tivesses feito nada, porque Tu fizeste o próprio tempo. E nenhum tempo é coeterno contigo, já que Tu persistes, ao passo que eles não seriam tempos se persistissem.

Livro XI, capítulo XIV – O CONCEITO DE TEMPO

Deus é persistente e eterno, já o tempo possui fim. Para nós, humanos e finitos, o tempo é o nosso ambiente existencial. Por esse motivo o tempo nos é muito importante. Nossa temporalidade grita para nós que haverá fim, que algo demora, que o que passou, passou. Aquilo que chamamos de presente é somente agora.

Então, temos a oração cristã, o momento em que o finito toca o infinito. Enviamos nossas preces para um lugar que não há tempo. Deus em sua atemporalidade recebe nossos pedidos e observa-os como se estivesse diante de uma pintura onde Ele mesmo é o pintor.

Diante disso, volto a cena descrita no início desse texto. Brianna, a filha de Jaime, se depara com um pedido do seu pai, realizado há dois séculos atrás. Ela ora e Deus ouve. Para ela, o quadro da vida do seu pai parece acabado. Mas e para Deus? Na série, essa oração pode ser respondida, pois o passado e o presente acontecem simultaneamente. Nós não cremos em um passado que se desenvolve, mas sim em um passado desenvolvido. Entretanto, nós cremos em um Deus que não deve dar importância ao tempo, porque esse tempo é apenas mais uma das suas criaturas.

Por fim, talvez seja por isso que é tão difícil esperar algo do Senhor, confiar nEle, viver reconhecendo que Ele está no controle de tudo. Porque estamos sob o tempo, pedindo a quem está sobre o tempo. De fato, Deus não dá importância ao tempo. Quem sabe não deva ser assim também a nossa percepção na vida? Quem sabe não precisamos nos desapegar do tempo e confiar no Ser atemporal? Este é um desafio – confiar em um Deus atemporal.

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